sábado, 28 de janeiro de 2012

Nós escolhemos nossas testemunhas


"Honrarás a teu pai e a tua mãe, para teres uma dilatada vida sobre a terra que o Senhor teu Deus te há de dar" (Decálogo, Êxodo, XX; 12).

Em 14-04-2011, às 8hs.

Sinto-me muito triste neste momento. Precisei tomar uma decisão, a qual eu não gostaria de ter tomado e, sei que marcará para sempre a minha vida. Neguei ajuda ao meu pai. Não que o tenha renegado, apenas, tive que impor limites ao seu acesso à minha casa, pela paz e harmonia do meu lar, da minha família. Esta decisão  fez-me sofrer desde que entendi que não mais poderia lhe dar o meu apoio. Sei que está passando por dificuldades financeiras e, possívelmente, psicológicas, pois, percebo em seu comportamento um certo "não aceitar envelhecer". Creio que não se preparou para a velhice, de forma alguma, parecia que esse dia não lhe chegaria, mas, chegou e, chegou-lhe inclemente. Na verdade, ele não teve auto-clemência quando não se preparou para a sua inevitável chegada. Ninguém pode pular as etapas da vida, é um ciclo. Feliz de quem pode vivê-las todas.

Há pouco tempo, acabou com o casamento de cinquenta anos. Fez suas escolhas, certas ou erradas, não cabe à mim julgá-las, como jamais julguei. Eu, ofereci-lhe meu apoio, deixei as portas da minha casa e, principalmente, a do meu coração, abertas. Porém, a minha vida começou a mudar, drasticamente, em função de sua vida, quando a escolha de mudar foi dele. Eu não escolhi mudar a minha vida, nem a minha família, que também deve ser respeitada.

Em nenhum momento, até hoje, senti como alguma vingança, ou qualquer outro tipo de ressentimento. Freá-lo foi necessário apenas para restabelecer a paz e harmonia na minha vida, pelo momento de transição em que me encontro e, por mais que pareça o contrário, para o bem dele próprio, para a sua evolução. Mesmo assim, sofro muito sabendo que, por decidir pelo meu bem-estar, ele está só pelo mundo, colhendo os frutos que semeou, tendo ao seu lado as companhias que escolheu.

Então, numa dessas noites em que chorava rezando por ele, adormeci na angústia de não saber como ele se encontrava, estive com um velho, ou melhor, "o velho". Levou-me para ver as andanças de meu pai. O caminho era escuro, sombrio e tenebroso. Pude ver muito sofrimento à sua volta, muitas sombras e, eu sem nada poder fazer. Então, gritava, no momento em que me agarrava a minha filha que dormia ao meu lado, na minha cama. Era horrível não poder acordar. Não poder tirá-lo do meio das sombras escuras que o acompamhava. Afinal, é o meu pai!

O velho disse-me que, naquele momento o caminho era dele, caminho que terá que percorrer sozinho, pois que, foram esses espíritos que ele escolheu por testemunhas. Nesse momento, para o meu bem, preciso abster-me. Então, fico pensando na caridade, refletindo sobre: "honrarás pai e honrarás mãe". Não seria contraditório afastar-me nesse momento de tormento, ainda que tenha sido uma escolha dele?

Liguei outro dia para saber dele. Disse-lhe que o sabia magoado com a minha recusa, pedi-lhe perdão apesar de não voltar atrás da minha decisão. Soube, por ele mesmo, que vem sofrendo horrores, passando por sérios problemas com as pessoas com que está se relacionando, enfim, a vida desandou. Queixa-se de não ter mais família, dos filhos que lhe abandonaram, dos quais, agora me incluo, já que lhe neguei "apoio".  A ligação caiu no momento em que relatava sobre ter passado por mais um tormento, vítima das más companhias. Fiquei deprimida ao constatar que o velho mostrara-me a verdade, realmente, este é um caminho que terá que seguir sem a minha ajuda. Resta-me, no momento, rezar. Voltei a sentir, em mim, todo o sofrimento dele, meu corpo sofria, minha cabeça doia.

Fiquei muito triste com a situação em que ele se colocou, mas não me sentia culpada por ela, apesar de, algumas vezes, ele próprio querer imputar-me culpa do seu insucesso, responsabilizando à minha falta de apoio o seu fracasso, passando essa idéia aos demais membros da família. É neste momento que nasce a minha culpa, para defender-me acabei por lhe fechar algumas portas. Deveria calar-me, sem me importar com as acusações das quais me fez vítima. Deveria perdoar-lhe pois estava ferido e só, mas acabei confessando aos demais o que ocorrera de fato, acabando por piorar a sua situação que já não era das melhores. Para não prejudicar, é melhor nada dizer ainda estando com a razão, o tempo se encarrega de tudo, por que Deus é justo, mas, sempre erramos neste sentido. No intuito de corrigir um erro causamos outro mais grave. Falta-nos a resignação. 

A maledicência tem esse efeito avassalador, quando falamos do outro, ainda que para a nossa defesa, fechamos-lhe várias portas além da nossa. Então, é aí que a maledicência se configura na falta de caridade. Quando podiamos nos calar, ainda que inocentes, deixamos a nossa lingua ir além dos nossos pensamentos, destruindo, talvez, a última oportunidade que o outro encontraria de se melhorar. Essa minha atitude com meu pai, hoje, dói em mim, principalmente, por que eu conhecia a "Palavra", meu pai não. À ele ainda é permitido não me entender, porém, eu jamais deveria proceder como procedi em resposta às suas acusações. Eu não havia deixado de lhe amar, apenas precisei dizer-lhe "não", para o nosso bem, ainda que para ele não soasse assim. 

Quando escolhemos um caminho que não condiz mais com as demandas do mundo, precisamos nos afastar de determinadas companhias, isso não significa, jamais, falta de amor, de querer bem, apenas não cabemos mais naquele mundo, não por que somos melhores do que ninguém, pois que, cada qual tem o seu próprio tempo para evoluir, aceitar os Ensinamentos, mas, certos comportamentos já não nos servem mais. Contudo, errei, pois não fui tolerante com a ignorância do meu pai, e esse meu erro mudou a minha vida para sempre. Feri a quem amo, e não consegui o seu perdão! Não consegui o meu perdão! Apesar de ainda nos falarmos, e, dizer-me que não há do que me perdoar, nunca mais esteve em minha casa.

Luz e Amor!


"E todo o que deixar, por amor do meu nome, a casa, ou os irmãos, ou as irmãs, ou o pai, ou a mãe, ou a mulher, ou os filhos, ou as fazendas, receberá cento por um, e possuirá a vida eterna" (Mateus, XIX; 29).

"A finalidade dessas expressões é mostrar, por uma figura, uma hipérbole, quanto é imperioso o dever de cuidar da vida futura. Deviam, por isso mesmo, ser menos chocantes para o povo e uma época em que, por força das circunstâncias, os laços de família eram menos fortes do que numa civilização moralmente mais avançada. (...) O Espiritismo no-las apresenta de mais alto, mostrando-nos que os verdadeiros laços de afeição são os do espírito e não os do corpo; que esses laços não se rompem, nem pela separação, nem mesmo pela morte do corpo; e que eles se fortificam na vida espiritual, pela depuração do Espírito: consoladora verdade, que nos dá uma grande força para suportar as vicissitudes da vida..." (Moral Estranha, cap. XXIII; 4-6. O Evangelho Segundo o Espiritismo).

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"(...) Quem se faz instrutor deve valorizar o ensino aplicando-o em si próprio" (Joanna de Ângelis.